Legalidade do anúncio de futura incorporação

Publicado em 3 de fevereiro de 2013

Corria o ano de 1996, e a Câmara de Mercado Imobiliário, hoje CMI – SECOVI/MG, se preparava para realizar um de seus mais importantes eventos anuais, a Medalha do Mérito Imobiliário, quando personalidades representativas dos mais diversos segmentos da sociedade receberiam essa comenda, por serviços prestados ao mercado imobiliário e à comunidade em geral, nos respectivos ramos de atuação, cabendo uma delas a um advogado.

Reunido o Conselho da Medalha, a escolha natural dessa categoria recaiu sobre o saudoso e festejado jurista Prof. Caio Mário da Silva Pereira, emérito advogado formado na Casa de Afonso Pena (carinhosa designação que damos à nossa Faculdade de Direito da UFMG), que exerceu a presidência do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, mas que se notabilizou no universo jurídico e em especial no segmento imobiliário, pela elaboração da Lei nº 4.591, de 1964, que ficou conhecida como a Lei dos Condomínios e Incorporações.

Por circunstâncias regimentais, a escolha do nome do notável professor me levou, juntamente com o então presidente da CMI, o dileto amigo Olímpio Naves Neto, a marcar uma visita para comunicá-lo da indicação, o que nos proporcionou momentos que sempre recordamos com carinho.

Além da simpatia e cordialidade do insigne advogado, sua fala mansa e segura fazia parecer que o tempo havia parado, tamanha a força com que nos cativava, especialmente quando começou a narrar a história dos fatos que cercaram a confecção da supracitada lei, cujo início foi sua convocação pelo então presidente imposto pelo regime de exceção recentemente instaurado, Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco, que lhe encomendou um projeto de lei, em curtíssimo espaço de tempo, objetivando disciplinar a questão das incorporações imobiliárias, que trazia prejuízos a compradores em geral, pela ausência de regras específicas.

Findo o prazo, foi marcada a entrega do projeto, que trazia a regulamentação das incorporações e condomínios, tendo surpreendido o mandatário, que questionou a extensão de seu pedido, quando o grande jurista respondeu que o condomínio era uma extensão da incorporação, e no curso da conversa tive a ousadia de indagar se, passados mais de trinta anos, a lei não necessitava de uma revisão, e o mestre me disse que a jurisprudência cuidaria de sua adaptação.

Pois foi justamente isso que aconteceu em um caso envolvendo o polêmico artigo 32 desse diploma legal, que veda ao incorporador a negociação de futuras unidades autônomas sem o prévio arquivamento da incorporação no respectivo Cartório de Registro de Imóveis, prática que pode inclusive configurar contravenção.

Em decisão sobre o tema, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina, em julgamento de Ação Civil Pública, entendeu ser ilegal todo e qualquer ato negocial que compreenda transferência de renda ou captação de recursos pelo incorporador anteriormente ao registro do empreendimento, sustentando ainda a responsabilidade solidária do corretor, estendendo a este a responsabilidade pelo ato.

No entanto, a parte relevante da decisão refere-se ao reconhecimento da legalidade da prática de publicidade do futuro lançamento, sem o exercício de atos negociais, que não se configura uma pré-venda, cujo intuito é levar ao público a notícia do posterior lançamento, o que permitiu distinguir a divulgação pura e simples da negociação efetiva, o que é vedado em lei.

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