Uma modalidade de locação crescente no mercado imobiliário, denominada built to suit, que pode ser traduzida como “construção sob medida”, tem se mostrado extremamente vantajosa ao usuário/locatário, uma vez que essa operação não exige imobilização de seus recursos financeiros na aquisição dos terrenos e construção das benfeitorias, além do aluguel a ser contabilizado como despesa, reduzindo a carga tributária.
Esse sistema permite a contratação pelo futuro usuário com um terceiro, que se responsabilizará por entregar um projeto personalizado, com localização, dimensão e características específicas e por ele definidas, que se compromete a pagar valores preestabelecidos por determinado período, usualmente não inferiores a dez anos.
A concepção desse tipo de empreendimento nos leva a deduzir que o valor pago a título de “locação” não constitui mera contraprestação pelo uso e gozo de um produto oferecido em um mercado aberto, uma vez tratar-se de imóvel construído por encomenda, diante da demanda especificada pelo usuário, o que já lhe confere uma baixa liquidez, além de representar um inadimplemento ao fluxo de caixa desenhado pelo empreendedor, em função das obrigações por ele assumidas.
Por essa breve explicação, é fácil verificar que se trata de uma relação contratual locatícia atípica, não se sujeitando a todos os preceitos da Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/91), por suas características diferenciada e inovadoras, especialmente por ser construído para atender às necessidades do usuário (intuito personae), não obstante possuir elementos específicos submetidos à referida legislação.
Exatamente por essa modalidade de locação não ter sido ainda tipificada pelo legislador brasileiro, duas de suas diversas peculiaridades podem trazer insegurança jurídica a essa forma de contratação: a renúncia ao direito do locatário solicitar revisão do valor locativo, previsto no art. 19 da Lei nº 8.245/91, e a impossibilidade de rescisão antecipada, salvo se o usuário arcar com igual valor dos aluguéis, nos termos dos arts. 413 e 473 do Código Civil Brasileiro.
Essas questões já chegaram aos nossos tribunais, onde a interpretação da natureza jurídica desses contratos tem admitido entendimentos distintos, pois ainda existe uma corrente minoritária que enxerga neles a mesma relação jurídica que caracteriza qualquer locação de imóvel urbano, tratado por seus defensores como um contrato típico, sujeito à Lei do Inquilinato.
O embasamento desses julgadores encontra-se no fato de que a liberdade de contratar e a autonomia da vontade estão sujeitas às normas de ordem pública, pois interessam à sociedade como um todo, o que não nos parece suficiente, e, se aplicado, ocasionaria o desequilíbrio contratual.
Felizmente a corrente predominante tem entendimento contrário, rechaçando totalmente essa interpretação e sustentando seu caráter atípico, referendando sua celebração na regra do art. 425 do Código Civil Brasileiro, fundada no princípio da liberdade de contratar, protegendo os investimentos realizados para atender à encomenda do usuário, com base no art. 473 do mesmo diploma legal.
Como forma de evitar eventuais questionamentos jurídicos, a estruturação das operações imobiliárias de built to suit tem adotado a cláusula arbitral, que auxilia na solução da controvérsia, ou a contratação da operação por meio da concessão real de superfície, prevista na Lei nº 10.257/01, o que não soluciona a questão, a ser resolvida somente por iniciativa de nossos legisladores, com a tipificação dessa modalidade contratual.
* Este artigo foi publicado em 15 de abril de 2012, portanto, anteriormente à Lei no 12.744, de 19 de dezembro de 2012, que disciplinou essa modalidade contratual na Lei no 8.245/1991.
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