Recentemente um jornal de economia destacou em sua primeira página, e também em manchete interna, que a adesão à arbitragem nos contratos em geral atingiu a espantosa cifra de 90% das ocorrências, o que denota a maturidade desse instituto nas relações comerciais.
Não obstante a pujança registrada, que denota a confiança nessa forma moderna de solução de conflitos, onde as partes em litígio elegem um terceiro neutro e imparcial para decidir a questão, e não o ingresso de uma ação na justiça, o mesmo não ocorre nas denominadas relações de consumo, dentre elas a compra e venda de imóveis.
Essa realidade é resultante de uma crença equivocada de que as controvérsias de natureza consumerista, ou seja, reguladas pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC),não podem ser solucionadas por arbitragem, não obstante essa legislação até mesmo incentivar a adoção dos mecanismos alternativos de solução de controvérsias.
A interpretação errônea decorre da existência de uma disposição no CDC que relaciona dentre as cláusulas abusivas aquelas que “determinam a utilização compulsória da arbitragem”, o que a Lei de Arbitragem (Lei nº 9.307/96) cuidou de proteger, ao estabelecer critérios claros de aplicação.
Nos casos em que as partes assinam contratos contendo cláusulas pré-determinadas, que não podem ser alteradas, conhecidos como “contratos de adesão”, foi estabelecido que a cláusula de arbitragem só é válida se o aderente (consumidor) iniciar o procedimento ou concordar explicitamente sob determinados formalismos.
A intenção do legislador é de nítida proteção ao consumidor, que somente se obriga a aceitar a arbitragem se estiver ciente de seu significado, o que se expressa pela cláusula estar em negrito, com visto especial ou em documento separado.
Em contratos comerciais em geral, o Judiciário tem rechaçado tentativas de descumprimento do acordado, como em brilhante decisão emanada de nosso Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em voto do Desembargador Tarcísio Martins Costa, pois a “cláusula compromissória arbitral implica na renúncia de jurisdição estatal, em favor da particular, constituindo o meio pelo qual as partes contratantes formalizam seu desejo de submeter à arbitragem eventuais divergências ou litígios sobre direitos disponíveis”.
Mais importante, em recentes decisões, nossos juízes têm pronunciado da mesma forma em contratos de adesão, que regulam relação de consumo em contrato de compra e venda de imóvel. Em Uberlândia, decisão exemplar da lavra da Dra. Marli Rodrigues da Silva, extinguiu o processo, uma vez que “estabelecida no contrato a convenção de arbitragem, nenhuma das partes, unilateralmente, poderá substituí-la pelo procedimento judicial com vistas a solucionar a controvérsia”.
No Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, outra notável decisão, proferida pelo Des. Sérgio Lúcio de Oliveira e Cruz, afirmou que o “consumidor está suficientemente defendido pelas exigências de clareza na instituição da cláusula e o árbitro é obrigado, ao julgar, a aplicar a lei de consumo, o que foi suficiente para o legislador, que, se quisesse, teria excluído as relações dessa natureza, mas não o fez”.
Mais ainda, ao concluir o voto adverte os que relutam em acreditar na arbitragem, observando que “causa espécie a resistência que nossos juristas têm à aplicação da lei de arbitragem, instrumento moderno de resolução de conflitos e que, ao contrário, deve ser incentivado no País, como é nos países desenvolvidos”.
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